"O sertão vai virar mar...
É o mar virando lama.
Gosto amargo do Rio Doce
De Regência a Mariana...
Mariana, Marina, Maria,
Marcia, Mercedes, Marília...
Quantas famílias com sede!
Quantas panelas vazias!
Quantos pescadores sem redes e sem canoas!
Quantas pessoas sofrendo!
Quantas pessoas...
Quantas pessoas sem rumo,
Como canoas sem remos...
Ou pescadores sem linhas e sem anzóis.
Quantas pessoas sem sorte,
Quantas pessoas com fome,
Quantas pessoas sem nome,
Quantas pessoas sem voz.
Adriano, Diego, Pedro, Marcelo, José...
Aquele corpo é de quem?
Aquele corpo, quem é?
É do Tião, é do Leo,
É do João, é de quem?
É mais um João ninguém...
É mais um morto qualquer.
Morreu debaixo da lama,
Morreu debaixo do trem.
Ele era filho de alguém?
E tinha filho mulher?
Isso ninguém quer saber.
Com isso ninguém se importa.
Parece que essas pessoas já nascem mortas!
E pra quem olha de longe,
Passando sempre por cima,
Parece que essas pessoas não tem valor.
São tão pequenas e fracas,
Deitando em camas e macas,
Sobrevivendo, sentindo tristeza e dor...
Quem nunca viu a sorte
Pensa que ela não vem,
E enche a cacimba de mágoa...
Hoje, me abraça forte...
Corta esse mal, planta o bem,
Transforma lágrima em água!
O sertão vai virar mar!
É o mar virando lama...
Gosto amargo do Rio Doce
De Regência a Mariana.
Quem olha a cima do alto,
Ou na TV, em segundos,
As vezes vê todo mundo...
Mas não enxerga ninguém.
E não enxerga a nobreza
De quem tem pouco, mas ama...
De quem defende o que ama
E valoriza o que tem.
Antonio, Kátia, Rodrigo,
Mauricio, Flávio e Taís...
Trabalham feitos formigas,
Tem uma vida feliz.
Sabem o valor da amizade e da pureza,
Da natureza e da agua, fonte da vida.
Conhece os bichos e plantas,
E como o galo que canta,
Levantam todos os dias
Com energia e com a cabeça erguida...
Mas vem a lama e o descaso, sem cerimônia,
Envenenado o futuro e o presente,
Como se faz desde sempre na Amazônia,
Nas nossas praias e rios, impunemente.
Mas o veneno e o atrasado
Disfarçado de progresso,
Que apodrece a nossa fonte, a nossa voz,
Não nos faz tirar os olhos do horizonte,
Nem polui a esperança que nasce dentro de nós.
É quando a lágrima no rosto a gente enxuga,
E segue em frente, persistente,
Como as tartarugas e as baleias,
E nessa lama nasce a flor
Que a gente rega com amor...
Que corre dentro do sangue nas nossas veias.
Quem nunca viu a sorte
Pensa que ela não vem,
E enche a cacimba de mágoa...
Hoje, me abraça forte...
Corta esse mal, planta o bem,
Transforma lágrima em água!
O sertão vai virar mar!
É o mar virando lama...
Gosto amargo do Rio Doce
De Regência a Mariana...
O sertão virando mar...
O mar virando lama...
Da lama nasce a flor!
Muita força, muita sorte,
Mais justiça, mais amor!
(Falamansa & Gabriel, O Pensador)